GÊNERO, NÚMERO E GRAU

Muitas vezes, quando concordamos plenamente com alguém, dizemos que “concordamos em gênero, número e grau”. Essa é uma maneira de usar a linguagem figurativamente, associando a concordância, como assentimento às ideias de outrem, à concordância, fenômeno gramatical.

 

Assim, dedico o post de hoje a esclarecer que, embora largamente aceita, e ainda hoje equivocadamente ensinada, a ideia de concordância em grau não se sustenta como fenômeno linguístico/gramatical.

 

A concordância  – nesse caso estamos falando da nominal, ok? – caracteriza-se como o processo por meio do qual os nomes (adjetivos e demais palavras periféricas ao substantivo) se flexionam para acompanhar o elemento nuclear da estrutura nominal (substantivo). Desse modo, em uma estrutura cujo núcleo seja o substantivo “meninas” (feminino e plural) , agregaremos elementos acessórios também no feminino e plural:

 

Aquelas      meninas       bonitas

 

Percebam que o pronome demonstrativo (aquelas) é, assim como o substantivo nuclear, feminino e plural; o adjetivo bonitas, por sua vez, também está flexionado no feminino e plural, de modo a concordar com o núcleo da estrutura nominal.

 

Agora, façamos um teste. Coloquemos o substantivo “meninas” na sua forma diminutiva: “menininhas”.

 

 

Aquelas menininhas bonitas.

 

 

Vejam que a concordância está perfeita e que os elementos periféricos ao substantivo não precisaram se flexionar em grau para estabelecer a concordância. Nada nos impede de dizer “vestidos lindíssimos”, em que o substantivo está no chamado grau “normal” e o adjetivo aparece no grau superlativo, ou até mesmo “corpinho magérrimo”, situação em que o substantivo está no diminutivo e o adjetivo está no superlativo. Ou seja, parece-nos claro que os mecanismos de flexão nominal para a concordância na Língua Portuguesa se resumem ao número e ao gênero.

 

Isso ocorre porque a variação em grau não pertence ao plano da flexão (ligada à concordância), mas ao plano da derivação (ligada à construção de novos itens lexicais). Assim, quando flexionamos uma palavra, acrescentamos a ela desinências necessárias ao ajuste da concordância; quando atuamos no plano da derivação, acrescentamos afixos, responsáveis pela criação de novos sentidos, novas palavras.

 

Os sufixos (e não desinências) de diminutivo e/ou de aumentativo são, portanto, elementos capazes de trazer novos traços semânticos às palavras a que se juntam, sendo esses traços muitas vezes mais afetivos do que lógicos. Quando dizemos, por exemplo, “aulão”, não estamos propriamente nos referindo a uma aula grande, mas talvez a uma aula boa, não é mesmo? Notem que tal é o comportamento derivacional que o sufixo aumentativo “ão” se junta, nesse em outros casos (“paredão”, “portão”, “caldeirão”), a uma palavra-base feminina formando um novo substantivo masculino. Ou seja, não se trata da flexão de uma palavra, mas da criação de uma nova palavra, de uma derivação! A derivação já foi assunto nosso aqui no site: clique aqui.

 

E então? Gostou? Entendeu? Concordou? Em gênero e número, certo? Como se diz por aí, “inclua o grau fora dessa”… rsrs

 

Um beijo e até a próxima!

 

Prof.ª Dr.ª Patrícia Corado

 

 

Tags
Gênero, Grau, Língua Minha, Número
3 Comentários
  • José Gllauco Smith
    Postado 15:22h, 30 outubro Responder

    Nossa, quanta clareza!!! Entendida a discussão, concordo em gênero e em número! rsrs

  • JADER CAVALCANTE DE ARAUJO
    Postado 01:58h, 15 julho Responder

    Professora, a forma correta do superlativo de magro não seria “macérrimo” ou “magríssimo”?

    • Patrícia Corado
      Postado 09:30h, 15 julho Responder

      Oi, Jander! O tema é controverso (rsrs). Gladstone Chaves de Melo, José de Nicola e Ernani Terra e Antenor Nascentes, por exemplo, condenam o uso de magérrimo e magríssimo e só aceitam macérrimo. Domingos Paschoal Cegallae Almeida Torres, por exemplo, indicam o uso de macérrimo (erudito) ou magríssimo (vulgar). Silveira Bueno, por outro lado, entende que macérrimo contraria as leis da fonética e só recomenda magérrimo e magríssimo. E agora? O VOLP, que é da ABL, nosso órgão oficial para dirimir dúvidas lexicais, acolhe as formas magérrimo e macérrimo, motivo que me leva a afirmar com segurança que ambas são formas corretas no Português. Quanto à forma popular magríssimo, embora não esteja registrada no rol da ABL, não deve ser por isso considerada errada. O VOLP não costuma registrar formas regulares de superlativo. Veja que magríssimo se constitui como uma forma regular (magro + íssimo) e é, portanto, perfeitamente empregável.

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